A CAUSA DA TRISTEZA - J.KRISHNAMURTI

A Causa da Tristeza

Todos os homens desejam descobrir por si próprios, com certeza, qual o propósito da vida. Esta descoberta somente pode ser feita mediante o viver e não por mero arquitetar de teorias intelectuais. Após a descoberta desse propósito, podem por ele trabalhar perseverantemente. Porém, para fazerem isto, precisam libertar-se, de todas as filosofias, dogmas, credos, religiões, ritos particulares — tudo pois que ninguém pode, por um momento sequer, descobrir seu verdadeiro propósito na vida, ou a própria vida, com todos esses impedimentos. Quando o homem houver se desapegado completamente de todas as coisas não-essenciais, pode começar a descobrir o que é que ele próprio está buscando. É na qualidade de indivíduo que ele tem de fazer essa descoberta.

Todo o homem está buscando libertar-se da tristeza. Desejo é vida e esse desejo está continuamente lutando contra as limitações. Ele procura ser livre. Em busca da felicidade está continuamente rompendo com as limitações.

Os homens estão a todo momento procurando a perfeição. A imperfeição é uma limitação e a vida individual, que começa na limitação, que vai de corrupção em corrupção, está incessantemente buscando a incorrupção e a liberdade. Enquanto durar a limitação, há tristeza e é da tristeza que todos os homens querem fugir. Estão buscando encontrar um caminho por meio do sofrimento, pelo emaranharem-se na roda da tristeza e da dor. No atingir da perfeição encontra-se a libertação e em nada mais.

Buscai a perfeição, portanto, em lugar das filosofias, das teorias, dos dogmas, das religiões e objetos de culto — que todos são irreais, infantis, não-essenciais. Os homens distraídos por todas essas coisas, não atacam o problema único que está na raiz de tudo isso que os sufoca, que cria devastação em sua auto-expressão, em seu crescimento individual.

Não desperdiceis tempo com sombras, que se esvaecem como a névoa da manhã.

Assim, voltamos novamente a essa coisa dinâmica que é o desejo. Podeis adorar falsos deuses — e todos os deuses são falsos — podeis aferrar-vos ao irreal, porém o desejo crescerá e vos subjugará, a não ser que encorajeis esse desejo na direção da perfeição. Somente com o desejo da perfeição deveis insistir, pois que esse desejo é vida; este somente se sobrepõe ao caos, as irrealidades às quais os homens se apegam, em lugar de se apegarem ao real.

Qual é a causa, pois, da tristeza? Com esta devemos nos preocupar. Tristeza e alegria, dor e prazer, luz e sombra, são a mesma coisa. A tristeza precisa existir, assim como o prazer. É inútil tentar fugir a qualquer delas. Somente quando estiverdes absolutamente isentos de ser perturbados por qualquer dessas coisas é que a verdadeira perfeição morará em vosso coração e mente.

O eu está sempre ascendendo para a perfeição pela auto-afirmação. Ele afirma “Eu sou”, à medida que vai subindo a montanha da experiência. Esta auto-afirmação do “Eu sou”, cria ecos e esses ecos voltam como tristeza, dor, prazer. Esta auto-afirmação do “Eu sou” é inevitável. A ela não podeis fugir. A auto-afirmação na imperfeição, cria a individualidade. A todo o instante estais afirmando “Eu sou”, “eu” penso assim e assado, “eu” sinto isto, “eu” sou muito maior que qualquer outra pessoa. O “Eu” está a todo o instante criando este imenso turbilhão de ecos que voltam sobre ele e o cegam. Quando, porém, houverdes atingido o preenchimento da vida, vosso “eu sou” não mais criará ecos, não mais criará turbilhões. No processo da auto-afirmação, o amor da vida que é o todo — à qual toda a vida individual ou universal tem de chegar — é esquecido.

Que é auto-expressão? Vós vos expressais sem conhecerdes vosso verdadeiro eu. Vós expressais o quer que vos venha à mente e por esse motivo existe esse caos combativo dos diferentes eus. Como uma árvore na floresta rouba a luz da sua semelhante, assim vós, em vossa auto-expressão, furtais a luz, o entendimento, a felicidade de outrem, e, assim, criais tristeza, infortúnio e fadiga. A verdadeira auto-expressão deve ser o resultado do amor à vida, que é liberdade, que é perfeição. Então, não podereis entrar em conflito com outrem. Então, tereis verdadeira benevolência para com o vosso próximo. Então, conhecereis essa unidade da qual falais tão desatinadamente. A partir do momento que percais o amor da vida e interponhais vossa auto-expressão do momento entre vós e o eterno, em vossa limitação, estareis tendendo a sofrer, a criar dor para vós e para os outros. Por esta razão devereis conhecer qual é o preenchimento final de toda a vida. Uma vez que tenhais alcançado uma visão da perfeição, como parte de vós próprios, no traduzir essa visão que, uma vez mais, é autoafirmação — reside a verdadeira criação. Criação, para a maioria das pessoas, significa edificar casas, pintar quadros, escrever poesias. Isto não é a verdadeira criação, isto é somente criação do eu na limitação. A verdadeira criação é a resultante dessa harmonia que é perfeição, o delicado equilíbrio da razão e do amor. A própria vida é criação, a vida mesma, é o maior dos artistas. Sereis capazes de atingir a perfeição em linha reta, estareis tornando-vos verdadeiro criador, ao serdes uno com a própria vida.


Não podeis fugir a auto-expressão, porque a própria existência é autoafirmação. Porém, o ser deve ser tornado perfeito por meio da autoafirmação, por meio da realização de que, enquanto a autoafirmação estiver em cativeiro, dentro da limitação, pelo fato de haverdes entendido, tereis sondado o amor da vida. 

Jiddu Krishnamurti, 1928

Fonte:http://pensarcompulsivo.blogspot.com.br/2016/07/a-causa-da-tristeza.html

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